Seria o Rei Salomão um Fatalista ?



     Uma leitura pouco criteriosa do livro bíblico de Eclesiastes, de autoria de Salomão, rei de Israel entre 971 a.C. e 931 a.C., pode levar o leitor a várias conclusões, entre elas a de que Salomão era um homem desiludido da existência, incapaz de acreditar em algo que seja, digamos, útil. Bom, de um ponto de vista superficial esta conclusão é mais do que possível. Entretanto, para entendermos Eclesiastes devemos levar em conta fatos contextuais da vida do rei.

     Sabe-se à luz da Bíblia que Salomão fora um homem sábio. Sabe-se ainda que esta sabedoria lhe foi concedida por Deus mediante um pedido que fez em uma oração. A Bíblia mostra também fatos históricos de seu reinado, entre eles um em que o rei julga a causa de duas prostitutas que discutiam pela maternidade de uma criança. Se utilizando de recursos psicológicos identificados no comportamento das mulheres, Salomão julgou a causa e deu a criança à mãe verdadeira (para saber mais da história leia 1 Reis 3: 16-28). Embora este fato reflita uma atitude sábia do rei, o contexto bíblico desta história mostra que a origem da sabedoria de Salomão é Deus.

     Apesar da fonte da sabedoria de Salomão, segundo a Bíblia, ser Deus, no livro de Eclesiastes há uma abordagem, por que não dizer, filosófica da vida. O autor põe em xeque o tal sentido da vida quando este vem acompanhado de subterfúgios meramente materiais. Isso é evidenciado em textos como:

“Contudo, quando avaliei tudo o que as minhas mãos haviam feito e o trabalho que eu tanto me esforçara para realizar, percebi que tudo foi inútil, foi correr atrás do vento; não há qualquer proveito no que se faz debaixo do sol” Eclesiastes 2:11 (NVI)

    Salomão parece não acreditar que haja uma razão existencial para o homem. Em parte do livro parece acreditar também que o homem é predestinado à angústia de saber que vai morrer. Seria então Salomão um fatalista? Um homem que não acreditava mais na possibilidade de ser feliz ou na felicidade?

    O fatalismo é uma doutrina segundo a qual todos os acontecimentos do universo, sobretudo os da vida humana, encontram-se submetidos ao destino, impossibilitando, assim, qualquer tipo de interferência humana. Podemos ainda dizer do fatalismo que é “tudo aquilo que faz pressão sobre a vontade humana de modo aparentemente irreversível” *. Existem referências em Eclesiastes que podem ilustrar esta doutrina:

“Todas as coisas trazem canseira. O homem não é capaz de descrevê-las; os olhos nunca se saciam de ver, nem os ouvidos de ouvir. O que foi tornará a ser, o que foi feito se fará novamente; não há nada novo debaixo do sol. Haverá algo de que se possa dizer: "Veja! Isto é novo!"? Não! Já existiu há muito tempo; bem antes da nossa época. Ninguém se lembra dos que viveram na antiguidade e aqueles que ainda virão tampouco serão lembrados pelos que vierem depois deles.” Eclesiastes 1: 8-11 (NVI)

     Além do posicionamento de Salomão acerca da angústia, da fatalidade, também há referências à morte como sendo o fim de tudo, o penhasco da existência:

“O destino do homem é o mesmo do animal; o mesmo destino os aguarda. Assim como morre um, também morre o outro. Todos têm o mesmo fôlego de vida; o homem não tem vantagem alguma sobre o animal. Nada faz sentido!” Eclesiastes 3:19 (NVI)

    Bom, será que estas referências podem afirmar que Salomão era fatalista? Certamente não. Como falamos no início, a fonte da sabedoria de Salomão é Deus. Naturalmente, embora as reflexões de Salomão pareçam evidenciar uma postura fatalista diante da vida, elas desbocam, mais tarde, na ideia de que Deus é o sentido da vida. Por outro lado, uma interpretação do livro deste ponto de vista, sugere que a angústia que assola o homem com a incerteza, com a brevidade e com a morte, é pertinente, digamos, ao o homem que não se lembra de Deus:

“Lembre-se do seu Criador nos dias da sua juventude, antes que venham os dias difíceis e antes que se aproximem os anos em que você dirá: "Não tenho satisfação neles” Eclesiastes 12:1 (NVI)

    Embora existam acontecimentos que são irreversíveis, como a morte, por exemplo, Salomão deixa claro que há algo “essencial” para o homem, este algo essencial seria o sentido da vida, a razão de viver.

“Agora que já se ouviu tudo, aqui está a conclusão: Tema a Deus e guarde os seus mandamentos, pois isso é o essencial para o homem” Eclesiastes 12:13 (NVI) 

    Enfim, essa afirmação é chave para fechar a porta da interpretação fatalista de Eclesiastes. Embora o homem sem Deus, o homem natural com a Bíblia o chama (1 Co 2:14), esteja passivo a todas as aflições descritas por Salomão de uma maneira efetiva, digamos assim, ao homem que teme a Deus é garantida a vida, o descanso e recompensa. 

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