Jejum Cristão, o que é isso ?



O jejum é uma das disciplinas espirituais frequente nas histórias bíblicas, porém negligenciada por muitos como algo menos importante ou dispensável. Mas o que é o jejum? Para que serve, o que a Bíblia fala a respeito e por que devemos praticá-lo? Quais são os propósitos reais que devem pautar nosso coração durante um jejum? Durante a leitura deste artigo você vai descobrir todas estas respostas.


O que é jejum?

Uma das práticas bíblicas nem sempre compreendidas e praticadas por muitos cristãos é o jejum. Oração, meditação, adoração, confissão, celebração: tudo isso de certa forma faz parte do ambiente de um cristão em seu dia a dia. Mas e o jejum? O que viralizou mais recentemente entre as dietas e blogs de nutrição é o jejum intermitente, com objetivos específicos de obter-se um benefício, normalmente a perda de peso.

O jejum na Bíblia aparece em diversas situações com objetivos muito específicos ou gerais, mas todos eles perseguem o mesmo propósito: buscar a Deus de forma intensa.

Um dos exemplos mais citados quando falamos de jejum, dentre vários que podemos nos lembrar na Bíblia, está na tentação de Jesus, que, guiado pelo Espírito Santo, foi conduzido ao deserto para ser tentado pelo diabo. Jesus buscava viver um tempo de consagração ali e, para isso, decidiu se abster de qualquer tipo de comida e concentrar toda sua atenção no Pai.

“O jejum cristão… é a fome que brota da saudade de Deus”, diz John Piper, renomado autor cristão. Mais do que qualquer outra coisa que possamos citar aqui, o anseio de todo o homem e mulher que faz um jejum deve ser encontrar-se com o Senhor e dedicar tempo a Ele, privando-se de algo que certamente temos priorizado acima do próprio Deus.

Mais importante do que fazer o jejum bíblico ou como fazê-lo, é o foco que damos para ele. O jejum deve ter direção certa no Senhor.
Por que Jejuar?


O principal objetivo do jejum é, ao rejeitar algo em favor dessa prática, fazer morrer todos os outros apetites. O jejum precisa ser acompanhado de tempos propositais e dedicados ao Senhor. O período de jejum é um espaço para analisarmos como temos andado em nossa vida e o que tem tomado nossa mente e coração.

Separar um tempo de jejum é repensar os dias, entregando ao Senhor aquilo que entregamos deliberadamente a outros ídolos de nossa vida e que, por vezes, sequer percebemos com a famosa “correria” do dia a dia. Somos sufocados pelas preocupações dessa vida e pelos pequenos prazeres e riquezas (Lucas 8:14) que vamos conquistando, e sempre fazendo algo para merecer aqui e ali. O jejum nos reposiciona.

Temos sido cobrados em nos esforçar, ser excelentes em tudo, entregar o máximo. O jejum é uma ótima oportunidade de voltarmos para o lugar correto: o colo do Pai.

O tempo de jejum pode ser o tempo para entregarmos aquilo que mais amamos e dedicamos nossa energia e atenção, como a comida, porém talvez o que mais tem tomado seu tempo e sua atenção não seja uma boa refeição, mas seu jardim, um bom café, viagens, internet, compras, exercícios, jogos com os amigos e tantas outras distrações que podemos citar.

“Se nós realmente compreendemos o jejum, devemos saber que… não deve ser confinado à questão de comida e bebida; o jejum deve, na verdade, incluir a abstinência de qualquer coisa, que seja legítima em si e por si, em favor de algum propósito espiritual especial. Existem muitas funções corporais que são corretas, normais e perfeitamente legítimas, mas que por razões peculiares especiais, em certas circunstâncias, devem ser controladas. Isso é jejum”.

[2] Martyn Lloyd-Jones (1899-1981)


Jejum como Renúncia

Algumas pessoas, por recomendação médica, não poderão jejuar por problemas de saúde ou não podem passar longos períodos sem comer e não há problema nisso. Biblicamente, jejum é renúncia; então é o tempo de fazer morrer todos os nossos apetites por outras coisas e concentrar tudo isso na pessoa de Cristo, pois Ele não nos pede parte de nossa vida. Ele requer tudo e disse: “Da mesma forma, qualquer de vocês que não renunciar a tudo o que possui não pode ser meu discípulo” (Lucas 14:33).

Qualquer coisa pode nos atrapalhar em nossa jornada com o Senhor. Até as coisas boas! E normalmente são essas que tomam espaço em nossa mente e coração e nos fazem esquecer de buscar a Deus. Enquanto fazemos uma caminhada, levamos os filhos da escola, conversamos com amigos, vamos a um aniversário, para academia, ou realizamos qualquer outra coisa, estamos sempre desejando algo.

Pode ser um simples e delicioso pãozinho fresquinho da padaria, um perfume ou um carro caro, estampado em um outdoor com modelos belíssimos nos dizendo com seus olhares e poses: “Veja como eu sou feliz e elegante por ter isso e você não!”.

Mediante todos esses estímulos, nosso coração terá sempre a tendência de ser obstinado e de perseguir coisas que sequer precisamos, mas como muitas coisas na pós-modernidade, sentimos que precisamos ter e conquistar para nos fazer felizes e aplacar um pouco dos sofrimentos que constantemente nos alcançam em nossa vida diária.

Foster disse em seu livro “Celebração da disciplina”: “Mais do que qualquer outra disciplina, o jejum revela as coisas que nos controlam. Esse é um benefício maravilhoso para aqueles que anseiam ser transformados à imagem de Jesus Cristo. Nós soterramos o que está dentro de nós com comida e outras coisas”.[3]

Que oportunidade maravilhosa nós temos em nos colocar na posição certa durante um tempo de jejum e posicionarmos nosso corpo e alma voltados diante do Espírito Santo. Muito mais do que se abster de comida, passos e atitudes são importantes durante o jejum:


Oração

Não existe jejum sem oração. Esse é um tempo de consagração e se separar especificamente para orar é extremamente importante para estabelecer essa conexão com o Pai.

Muitos podem ficar apenas sem comer, sem acessar redes sociais, sem café, mas se for apenas uma abstenção de algo sem busca dedicada ao Senhor, será apenas uma pausa num hábito e, provavelmente, você ficará profundamente estressado para retornar a ele o mais rápido possível.

O jejum é uma oportunidade de provar o nosso amor através de um sacrifício, uma entrega de algo a Deus e para Ele. Além disso, dedicar esse tempo ao Senhor, passar tempo com o Pai e desfrutar de Sua presença.


Adoração

Adorar não é cantar uma canção. Adorar é elogiar com os lábios, é reconhecer, expressar a Deus o que sabemos Dele e o que Ele merece ouvir, falar sobre Seus atributos, sobre Seus nomes, reconhecer o que Ele fez hoje e no passado, exaltar a bondade, o amor, a graça e a misericórdia que Ele tem para conosco.

Colocar uma canção de adoração é claro que nos ajudará a viver nossos momentos, expressando ainda mais intensamente louvor ao Senhor, porém aqui queremos ressaltar que é necessário haver um desejo, uma intenção de nosso coração em adorá-Lo e buscá-Lo durante o jejum.

“Externamente, você continuará cumprindo as obrigações comuns de cada dia, mas internamente estará orando e louvando, cantando e adorando”, diz o escritor Richard Foster.


Motivação

Nas Escrituras, vemos muitas situações para a realização do jejum. Cito algumas: A igreja de Antioquia adorava e jejuava ao Senhor quando o Espírito Santo falou com eles (Atos 13:2)

Após jejum e oração, eles enviaram obreiros ao campo missionário (Atos 13:2)

Para arrependimento de pecados (1 Samuel 7:6)

Davi jejua como expressão de luto por Saul e Jônatas (2 Samuel 1:12)

Quando Ester se preparava para se apresentar diante do Rei, um jejum coletivo foi convocado (Ester 4:16)

Em aflição, Davi jejua por seu primeiro filho com Bate-Seba (2 Samuel 12:16)

O jejum pode ser iniciado por diversos motivos e situações, seja um coletivo de sua igreja ou célula, seja pessoal. Porém, ele sempre deve ter o propósito de estar em sintonia com o Senhor e nunca como barganha com os céus, pois em Cristo já somos plenamente abençoados. Comunhão, intimidade e relacionamento estão intimamente ligados ao jejum, que deve ser executado exatamente por esse motivo e não por qualquer outro.


Fome

Nosso foco é sempre o Senhor. Jesus disse que ele é o pão da vida e mais: 

“Aquele que vem a mim nunca terá fome; aquele que crê em mim nunca terá sede” (João 6:35).

Jejuar é reposicionar o coração. 

Quando nos vemos perdidos, cheios de outros apetites pelas coisas desta terra, precisamos nos lembrar dessa palavra de Jesus. Ele é o nosso alimento principal e, se estivermos plenamente saciados Nele, os alimentos em si e as coisas deste mundo não serão o principal a nos preencher quando finalmente obtivermos determinada coisa ou formos amados e reconhecidos pelas pessoas. Seremos plenamente satisfeitos Nele.

Jesus disse-lhes: 
“A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou, e realizar a sua obra” (João 4:32-34). 
Você tem fome de quê?


Palavra

A Palavra de Deus é alimento, sem ela morreremos. O jejum pode tirar de nós temporariamente alguma coisa que parece muito importante, mas Jesus disse que “Nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus” (Mateus 4:4).

Precisamos ser preenchidos por Sua voz, Sua palavra. 

A leitura das Escrituras nos dará norte e trará realidades além daquilo que podemos ver e entender mediante os nossos desafios terrenos.


Tipos de jejum

Jejum de Daniel

No cativeiro na Babilônia, Daniel e seus amigos recebiam uma porção diária de comida e bebida da mesa do próprio Rei, mas Daniel e seus amigos decidiram não comer. 
Por isso, Daniel pediu ao chefe dos oficiais permissão para se abster deles (Daniel 1:8), de acordo com aquilo que era considerado impuro pela lei de Moisés. Eles comiam apenas vegetais e bebiam água. 


Jejum à base de líquido: apenas líquidos são ingeridos nesta modalidade.
Jejum total: quando não se come nada e bebe-se apenas água.
Jejum parcial: durante esse jejum, faz-se apenas uma refeição por dia.


Importante: Não faça um jejum por moda, principalmente se você tem alguma condição de saúde. Mais importante do que jejuar é o porquê. E, principalmente, converse com um médico para ajustar a sua rotina diária.


Duração do jejum

Nas Escrituras, encontramos diferentes períodos de duração para o jejum, conforme veremos a seguir:

1 dia – Jejum do Dia da Expiação (Levíticos 23:27)

3 dias – Jejum de Ester (Ester 9:31)

7 dias – Jejum pela morte de Saul (1 Crônicas 10:12)

14 dias – Jejum de Paulo e da tripulação do navio (Atos 27:33)

21 dias – Jejum de Daniel em favor de Jerusalém. (Daniel 9:3)

40 dias – Jejum do Senhor Jesus no deserto. (Mateus 4:1,2)


Exemplos de Jejum na Bíblia

Vamos tratar aqui de três exemplos relevantes das Escrituras:


1. Rei Jeosafá

Em um tempo de grande prosperidade do reinado de Jeosafá, rei de Judá e filho de Asa, surgiu uma grande ameaça por parte dos filhos de Moabe e Amom contra ele, seu reinado e seus territórios. A Bíblia nos fala que nesse momento Jeosafá teve medo, buscou ao Senhor “e apregoou jejum em todo o Judá. E Judá se ajuntou, para pedir socorro ao Senhor; também de todas as cidades de Judá vieram para buscar ao Senhor” (2 Crônicas 20:1-4).

O medo foi um impulsionador para a tomada de decisão do rei, que convocou um jejum coletivo de todo o povo de Judá.


2. Esdras

Mais um exemplo de jejum coletivo nas Escrituras é a história do povo de Israel com Esdras no retorno para Jerusalém. O rei havia liberado a partida do povo, porém Esdras teve vergonha de pedir escolta para que os acompanhasse no caminho de volta, com todos os seus bens, famílias e pertences, caminhando por lugares ermos e possivelmente perigosos.

“Então apregoei ali um jejum junto ao rio Aava, para nos humilharmos diante da face de nosso Deus, para lhe pedirmos caminho seguro para nós, para nossos filhos e para todos os nossos bens” (Esdras 8:21). Mediante o quebrantamento do povo, Esdras diz: “Por isso jejuamos e suplicamos essa bênção ao nosso Deus, e ele nos atendeu” (Esdras 8:23).


3. Jesus

Jesus nos ensinou sobre o jejum da mesma forma e no mesmo momento que nos ensinou a orar. É interessante notar que ele começa sua fala ao abordar essa prática espiritual em Mateus 6, dizendo: “Quando jejuarem…” Jesus parte do pressuposto que já estamos jejuando!

O que era uma prática muito comum em seu tempo, mas chama atenção para algo relevante, praticado por um grupo que ele chamou de hipócritas mais de uma vez: os fariseus. Eles queriam mostrar para todo mundo o quão religiosos eram, perfeitos nas práticas das disciplinas espirituais e, para isso, mudavam a aparência do rosto e pareciam tristes, para mostrar a todos que estavam em período de jejum, e Jesus adverte:

“Ao jejuar, ponha óleo sobre a cabeça e lave o rosto, para que não pareça aos outros que você está jejuando, mas apenas a seu Pai, que vê no secreto. E seu Pai, que vê no secreto, o recompensará” (Mateus 6:17,18).

Jesus estava querendo nos ensinar sobre a maneira correta de jejuar, nunca buscando nossa própria glória, mas a Dele.


Como começar?

Não podemos viver sem comer, e certamente não conseguiremos jejuar todos os dias do ano, seja de comida ou de qualquer outra coisa que escolhermos. São costumes que fazem parte de nossa vida e alguns deles fazem parte do nosso dia a dia, inclusive de nossas escolhas profissionais.

Se você nunca jejuou, comece analisando sua vida e escolha algo para que você dedica muito tempo ou muita preocupação e retire de sua rotina. Se decidir jejuar por comida, talvez comece com poucos dias e jejum parcial, de apenas uma refeição, e depois vá gradualmente aumentando.

Nosso corpo e nossas emoções certamente gritarão. Haverá uma guerra interna entre nossos apetites e a fome por Deus. Você poderá sentir irritação, tristeza, fome, angústia, mudança de humor, mas poderá trocar todos esses sentimentos por proximidade e relacionamento com o Espírito.

Experimente jejuar e viver um novo tempo em seu relacionamento com o Pai.

Espero que, ao jejuar, você tenha fome, fome de Deus.
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