Fundamentos: Deus e a Trindade




DEUS PODE SER COMPREENDIDO?


    Durante uma palestra nos Estados Unidos, um estudante perguntou ao teólogo suíço Karl Barth: "Dr. Barth, qual foi a coisa mais profunda que o Senhor já aprendeu em seu estudo da teologia?" Barth pensou por um momento e depois respondeu: "Jesus me ama, isto eu sei, pois a Bíblia assim o diz" (trecho de corinho para crianças).
    Os estudantes sorriram diante da resposta tão simplista, mas a risada deles tornou-se um sorriso tímido quando lentamente perceberam que Barth estava falando sério. Karl Barth deu uma resposta simples para uma pergunta profunda. Ao fazer isso, estava chamando a atenção pelo menos para duas noções de vital importância.


(1) Na verdade cristã mais simples reside uma profundidade que pode ocupar a mente das pessoas mais brilhantes por toda uma vida.

(2) Mesmo no aprendizado da teologia mais sofisticada, realmente nunca ultrapassamos o nível de uma criança no entendimento das misteriosas profundidades e riquezas do caráter de Deus.

    Outro grande Teólogo Ele dizia que Deus fala conosco numa espécie de balbucio. Como os pais se empenham em falar numa "linguagem de bebê", quando se dirigem a seus filhos pequenos, assim também Deus, para se comunicar conosco, míseros mortais, precisa condescender a falar de maneira que possamos compreender. Nenhum ser humano tem a habilidade de compreender a Deus exaustivamente.

    Existe uma barreira que impede a compreensão total e abrangente de Deus. Somos criaturas finitas; Deus é um ser infinito. Nisso reside o nosso problema.

    Como o finito pode compreender o infinito? Os teólogos medievais tinham uma frase que se tornou um axioma dominante em todo estudo posterior de teologia:

"O finito não pode apreender (ou conter) o infinito".

Nada é mais óbvio do que isso: um objeto infinito não pode ser comprimido dentro de um espaço finito.

    Esse axioma comunica uma das doutrinas mais importantes do Cristianismo ortodoxo. E a doutrina da incompreensibilidade de Deus. O termo pode ser mal-interpretado. Pode nos sugerir que, já que o finito não pode "apreender" o infinito, então não podemos saber nada sobre Deus. Se Deus está além da compreensão humana, isso não insinua que toda a nossa discussão religiosa não passa de tagarelice teológica e que, quando muito, somos deixados com um ´´altar destinado a um Deus desconhecido? Essa de maneira alguma é a intenção.
    A incompreensibilidade de Deus não significa que não sabemos nada sobre ele. Antes significa que nosso conhecimento é parcial e limitado, muito além de um conhecimento ou de uma compreensão plena. O conhecimento que Deus nos dá por meio da revelação é real e útil. Podemos conhecer a Deus na mesma medida em que ele escolhe se revelar a nós.
    O finito pode "apreender" o infinito, mas o finito jamais poderá abarcar completamente o infinito. Sempre haverá mais sobre Deus do que podemos apreender a Bíblia se refere a isso da seguinte maneira:

"As coisas encobertas pertencem ao Senhor, nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem, a nós e a nossos filhos para sempre " (Dt 29.29).

    Martinho Lutero referiu-se a dois aspectos de Deus — o oculto e o revelado. Uma porção do conhecimento divino permanece oculta de nossa vista.
    Trabalhamos à luz do que Deus nos revelou. Assim como a Escritura é a suprema fonte de informações sobre si mesma, Deus é a mais alta fonte de informações mais elevada sobre Ele próprio, Isso faz sentido, pois, se houvesse outra fonte mais elevada de informação então Ele não seria Deus.
    Por conseguinte, é importante que qualquer estudo sobre o Senhor considere o que Deus diz sobre si mesmo nas páginas da Escritura.


SINTETIZANDO


1. Existe um profundo significado mesmo na verdade cristã mais simples.

2. Não importa quão profundo seja o nosso conhecimento teológico, sempre haverá muitos aspectos da natureza e caráter de Deus que permanecerão um mistério para nós.

3. Nenhum ser humano pode ter um conhecimento pleno de Deus.

4. A doutrina da incompreensibilidade de Deus não significa que não podemos conhecer nada sobre ele. Significa que nosso conhecimento é limitado, restringido por nossa humanidade.




PARA DISCUSSÃO E AVALIAÇÃO

1. O que significa o axioma teológico "O finito não pode conter o infinito"?

2. A noção da grandeza de Deus não pode nos desanimar na busca de conhecê-lo mais?

Não seria inútil, de nossa parte, continuar tentando compreender um Deus que é de todo incompreensível?

3. Que verdade da fé cristã soa como mais profunda para você? E qual parece ser a mais simples?


A TRIUNIDADE DE DEUS



A doutrina da Trindade é difícil e complexa para nós. As vezes pensamos que o Cristianismo ensina a noção absurda de que 1 + 1 + 1 = 1. Esta equação é claramente falsa. 
O termo Trindade não descreve a relação de três deuses, mas de um único Deus que é três pessoas.
Trindade não significa triteísmo, ou seja, que existem três seres que juntos são Deus. A palavra Trindade é usada num esforço para definir a plenitude da Deidade, tanto em termos da sua unidade como da sua diversidade. A formulação histórica da Trindade é que Deus é um em essência e três em pessoas.

Embora tal fórmula seja misteriosa e mesmo paradoxal, de maneira nenhuma é contraditória.

    A unidade da Deidade é afirmada em termos de essência ou ser, enquanto que sua diversidade é expressa em termos de pessoas.
    Embora o termo trindade não seja encontrado na Bíblia, o conceito claramente está lá. Por um lado, a Bíblia afirma veementemente a unidade de Deus (Dt 6.4). Por outro lado, ela afirma claramente a plena divindade das três pessoas da Deidade: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. A Igreja tem rejeitado as heresias do modalismo e do triteísmo.
    O modalismo nega a distinção das pessoas dentro da Deidade, alegando que Pai, Filho e Espírito Santo são apenas modos pelos quais Deus se revela. O triteismo, por outro lado, declara falsamente que existem três seres que juntos formam Deus.

O termo pessoa não significa uma distinção em essência mas uma diferente subsistência na Divindade.


    A subsistência na Deidade é uma diferença real, mas não essencial, no sentido de uma diferença no ser. Cada pessoa subsiste ou existe "sob" a pura essência divina. Subsistência é uma diferença dentro do escopo do ser, não um ser ou uma essência separada Todas as pessoas da Deidade possuem todos os atributos divinos.
    Existe também uma distinção na obra realizada pelas pessoas da Trindade Num sentido, a obra da salvação é comum a todas as três pessoas da Trindade Mesmo assim, na maneira de atividade existem diferentes operações assumidas pelo Pai, pelo Filho e pelo Espírito Santo.
    O Pai inicia a criação e a redenção; o Filho redime a criação; o Espírito Santo regenera e santifica, aplicando a redenção aos crentes.

    A Trindade não se refere a partes de Deus ou mesmo a seus papéis. As analogias humanas, como a do homem que é pai, filho e marido, não conseguem captar o mistério da natureza de Deus.
  A doutrina da Trindade não explica plenamente o mistério do caráter de Deus. Ao contrário, simplesmente estabelece o limite do qual não devemos passar. Define os limites da nossa reflexão finita. Exige que sejamos fiéis à revelação bíblica de que em um sentido Deus é um e em outro sentido diferente ele é três.

O SIGNIFICADO DA TRINDADE


    Pelo fato de Deus consistir em três pessoas distintas, o Pai não é o Filho ou o Espírito Santo, o Filho não é o Pai ou o Espírito Santo, e o Espírito Santo não é o Pai ou o Filho. Isso foi demonstrado mediante numerosas passagens citadas. Cada uma das pessoas da Trindade é plenamente equivalente a Deus.
    A divindade de Deus, o Pai, é mostrada a partir do primeiro versículo da Bíblia: “No princípio criou Deus o céu e a terra” (Gênesis 1:1), e assim ao longo de todas as páginas da Escritura.
    Quando a Bíblia se refere simplesmente a Deus, mais frequentemente o faz a Deus, o Pai. Mas Deus, o Filho, que veio à Terra como Jesus Cristo, também é totalmente Deus. Como Paulo escreve sobre ele em Colossenses 2:9: “Porque nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade”. Assim, Tomé, o discípulo de Jesus, estava correto quando disse a este: “Senhor meu e Deus meu” (João 20:28). Na verdade, João disse que escreveu seu evangelho para que as pessoas “cressem que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus” (João 20:31).
    Por fim, Deus, o Espírito Santo, também é plenamente Deus, porque tanto o Pai como o Filho são Deus, de modo que faz sentido que todos os três sejam mencionados com igual importância em passagens como Mateus 28:19 (“batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”) Isso mostra que a Escritura identifica os três totalmente com Deus. Pedro atesta esse ponto de vista quando acusa alguém de mentir ao “Espírito Santo” (Atos 5:3), e depois explica que esse homem “não mentiu aos homens, mas sim a Deus” (Atos 5:4). Paulo diz que o Espírito é onisciente como Deus, o Pai, quando escreve: “Ninguém conhece as coisas de Deus, a não ser o Espírito de Deus” (1Coríntios 2:11).
    Mas a Bíblia também é clara sobre existir apenas um Deus e não três. Ela diz que Deus é apenas uma essência ou um ser. Deuteronômio 6:4 diz: “O nosso Deus é o único Senhor”. Deus frequentemente faz ecoar essa afirmação, tornando claro que não há outro Deus senão ele. Isaías 45:5 é um exemplo disso: “Eu sou o Senhor, e não há nenhum outro; além de mim não há Deus”.

Paulo confirma essa declaração em Romanos 3:30, quando escreve: “Existe um só Deus”. E novamente em 1Timóteo 2:5: “Pois há um só Deus”. Em Tiago 2:19 descobrimos que mesmo os demônios reconhecem isso: “Tu crês que há um só Deus; fazes bem. Também os demônios o creem, e estremecem”.
    Às vezes, parece complexo entender como há três pessoas distintas da Trindade, cada uma sendo plenamente Deus, embora haja somente um Deus indivisível.
    E é difícil realmente. A Trindade é um daqueles mistérios que só podemos explicar em parte. Embora diferentes analogias da criação possam nos ajudar um pouco na compreensão da Trindade, em última análise todas elas falham em descrever esse mistério, pois tentam explicar o ser divino em termos de criação.
    São tentativas de elucidar como Deus existe por meio de sua criação, mas nada na criação é exatamente como o ser divino. As tentativas de simplificar ou explicar completamente esse mistério fracassam e muitas vezes conduzem a crenças contrárias aos ensinamentos da Bíblia. Em resumo, a doutrina da Trindade é algo que nunca compreenderemos plenamente, porque parte dela está além do nosso entendimento.
    Ela é, em parte, uma dessas “coisas encobertas [que] pertencem ao Senhor nosso Deus” (Deuteronômio 29:29).
    No entanto, é extremamente importante que esse mistério seja verdadeiro. Por exemplo, se Jesus não fosse plenamente Deus, e sim uma pessoa separada dele, então ele não poderia suportar a ira completa de Deus, morrer e ressuscitar dos mortos. E se Jesus não ressurgisse dos mortos, qualquer crença nele seria ingênua, e aqueles que afirmam ser cristãos seriam, nas palavras de Paulo, “dentre todos homens [...] os mais dignos de compaixão” (1Coríntios 15:19).

UM PARADOXO

    A fórmula para a Trindade é paradoxal, mas não é, de modo algum, contraditória. A lei da não contradição afirma que algo não pode ser e não ser o que é ao mesmo tempo e no mesmo relacionamento. Por exemplo, posso ser um pai e um filho no mesmo tempo, mas não no mesmo relacionamento.
    A fórmula histórica é que Deus é um em essência e três em pessoa. Ele é um de uma maneira e três de outra maneira. Para violar a lei da não contradição, alguém teria de dizer que Deus é um em essência e, ao mesmo tempo, três em essência ou que Deus é um em pessoa e, ao mesmo tempo, três em pessoa.
    Portanto, quando consideramos as categorias formais de pensamento racional, vemos, objetivamente, que a fórmula da Trindade não é contraditória.

OS PAPÉIS DISTINTOS DA TRINDADE

    Todos os membros da Trindade têm papéis diferentes. Por exemplo, sabemos que na criação Deus falou e trouxe a Terra à existência (Gênesis 1:9-10). Mas em João 1:3 nos é dito que Deus o Filho executou estas palavras: “Todas as coisas foram feitas por intermédio dele; sem ele, nada do que existe teria sido feito”. E, como está escrito em Gênesis 1:2, enquanto Deus estava criando, “o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas”, isto é, apoiando e manifestando a presença de Deus na criação.
    Os diferentes papéis da Trindade também podem ser vistos em nossa salvação. Deus o Pai “tanto amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito” e o enviou ao mundo “para que este fosse salvo por meio dele” (João 3:16-17).
    Sobre seu papel, Jesus disse: “Pois desci do céu, não para fazer a minha vontade, mas para fazer a vontade daquele que me enviou” (João 6:38). E essa vontade foi que Jesus morresse por nossos pecados para que não precisássemos perecer (Hebreus 10:10). Quando Jesus ressuscitou dos mortos e subiu ao céu, ele e o Pai enviaram o Espírito Santo para concluir a obra que o Pai e o Filho começaram (João 14:26 e 16:7).
    Tanto na criação como na redenção, o Pai, o Filho e o Espírito tiveram papéis distintos. Foi o Pai que dirigiu e enviou tanto o Filho como o Espírito, e foi o Filho quem, juntamente com o Pai, enviou o Espírito. O Filho era obediente ao Pai, e o Espírito era obediente tanto ao Pai quanto ao Filho. E embora ambos, o Filho e o Espírito, tenham seus papéis e continuem a desempenhá-los em igualdade com o Pai, eles fazem isso em submissão ao Pai.
    Essas diferentes funções são simplesmente decorrência da relação eterna entre o Pai, o Filho e o Espírito. Elas não diminuem a deidade, os atributos ou a natureza essencial do Pai, do Filho ou do Espírito. A distinção é simplesmente na maneira como eles se relacionam uns com os outros e com a criação. Isso é muito diferente da nossa própria experiência, na qual cada pessoa também é um ser diferente. Mas de alguma maneira o ser divino é tão diferente do nosso que pode se dividir em relações interpessoais entre as três diferentes pessoas. Isso não se compara a nada daquilo que jamais vivenciamos, experimentaremos ou compreenderemos plenamente.

    Todavia, a unidade e a diversidade dentro da Trindade fornecem um maravilhoso fundamento para a unidade e diversidade que sentimos cada dia. No casamento, por exemplo, duas pessoas distintas se juntam e, por meio do casamento, tornam-se “uma só carne” (Efésios 5:31). Como marido e mulher têm igual posição, valor e personalidade perante Deus, eles também têm papéis distintos. Assim como o Pai tem autoridade sobre o Filho, no casamento o marido tem autoridade sobre a mulher. Como Paulo diz em 1Coríntios 11:3: “O cabeça de todo homem é Cristo, e a cabeça da mulher é o homem, e a cabeça de Cristo é Deus”. Apesar de, às vezes, ser difícil descobrir como os papéis de marido e mulher devam ser especificamente definidos, a Bíblia deixa claro que a relação dentro da Trindade fornece o modelo para o relacionamento no matrimônio.
    Outro exemplo de unidade e diversidade é visto na igreja, que tem “muitos membros” e todos com diferentes capacidades, mas “um corpo” com um propósito (1Coríntios 12:12). Isso também é visto na composição étnica da igreja, que inclui membros “de todas as nações, tribos, povos e línguas” (Apocalipse 7:9).
    Essa diversidade adiciona uma complexidade que nos mostra a sabedoria de Deus ao permitir que tanto a unidade como a diversidade existam dentro de seu mundo. 
    A unidade e a diversidade que existem no mundo é simplesmente um reflexo da unidade e diversidade existente no seio da Trindade.

1. O que significa o axioma teológico "O finito não pode conter o infinito"? 
2. A noção da grandeza de Deus não pode nos desanimar na busca de conhecê-lo mais? Não seria inútil, de nossa parte, continuar tentando compreender um Deus que é de todo incompreensível? 
3. Que verdade da fé cristã soa como mais profunda para você? E qual parece ser a mais simples?

SINTETIZANDO

1. A doutrina da Trindade afirma a triunidade de Deus.
2. A doutrina da Trindade não é uma contradição: Deus é um em essência e três em pessoa.
3. A Bíblia afirma que Deus é único e também afirma a divindade do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
4. A Trindade distingue-se pelo trabalho realizado pelo Pai, pelo Filho e pelo Espírito Santo.
5. A doutrina da Trindade estabelece os limites da especulação humana a respeito da natureza de Deus.

PARA DISCUSSÃO E AVALIAÇÃO

1. O que são as doutrinas do "monismo" e do "triteísmo"?
2. Quais são as diferentes operações do Pai, Filho e Espírito Santo na obra da salvação?
3. De que modo a doutrina da Trindade pode afetar nossa vida de oração?
4. Que diferença faz sabermos das obras que cada uma das três pessoas da Trindade realizou e continua realizando no plano da salvação?
5. A doutrina da Trindade pode atrapalhar um incrédulo a aceitar o evangelho como verdadeiro? Ela deveria ser ensinada para alguém que está sendo evangelizado? Por quê?
6. Quando adoramos a Deus, adoramos uma só pessoa, ou três?


OS ATRIBUTOS E DEUS


Os atributos de Deus são qualidades atribuídas ao caráter divino de acordo com sua auto-revelação e que nos ajudam a entender quem é Deus. Saber quais são os atributos de Deus é muito importante para qualquer cristão verdadeiro.Além da designação “atributos de Deus”, às vezes a Teologia Sistemática também denomina tal estudo de “qualidades de Deus” ou “perfeições de Deus”, de modo que devemos entender todas essas expressões como sendo sinônimas.

Os atributos de Deus descreve plenamente quem Ele é?

    É importante entender que Deus não pode ser explicado ou definido de forma plena e compreensível aos homens. Sob esse aspecto, não se pode expressar o ser de Deus de forma adequada com algum atributo, palavra ou frase, ou seja, mesmo o estudo sobre os atributos de Deus o descreve de forma limitada, pois Deus, em sua plenitude, é completamente incompreensível para nós.
    Algo que precisa ser considerado é que conhecemos Deus apenas com base no que Ele resolveu nos revelar. Assim, há muito mais sobre Deus que não conhecemos, ou porque nosso intelecto não consegue compreender, ou porque Ele simplesmente não nos revelou.
    No entanto, devemos nos confortar na verdade de que Ele certamente nos revelou tudo o que de fato precisaríamos saber. A revelação de Deus aos homens é tão clara, tanto na criação quanto nas Escrituras, que torna qualquer um que negligencie tal revelação indesculpável (Rm 2).

Qual a importância de se estudar os atributos de Deus?

    Quando estudamos os atributos de Deus, mesmo de forma limitada, podemos vislumbrar o seu caráter, entender um pouco mais sobre quem Ele é e como Ele é, e consequentemente adorá-lo e atribuir-lhe glória de uma forma mais apropriada e consciente. Os atributos de Deus também nos auxiliam na compreensão da natureza infinita de Deus em relação ao universo. Ele é auto-existente, um ser independente e infinitamente exaltado sobre a natureza, e que não sofre nenhum tipo de limitação por ela. Esse aspecto é chamado na teologia de transcendência.
    Por outro lado, sua presença e seu poder agem ativamente dentro de sua criação, de modo que Ele não é um simples espectador da História, mas é quem controla e conduz todas as obras de suas mãos de acordo com seu propósito. Esse aspecto é chamado na teologia de imanência.
    Também entendemos que os atributos de Deus fazem parte da própria essência do seu ser, ou seja, as qualidades de Deus e seu ser são uma coisa só, de modo que cada um de seus atributos é infinito e não conhece nenhum tipo de limitação.

Erros na interpretação dos atributos de Deus

    Algumas pessoas, por não compreenderem adequadamente os atributos de Deus, acabam cometendo erros gravíssimos na interpretação das Escrituras, e fazem descrições do caráter de Deus que, no mínimo, afrontam o seu ser perfeito.
    Por exemplo, algumas pessoas priorizam um dos atributos de Deus em detrimento de outro. O caso mais clássico sobre esse erro ocorre na interpretação da relação entre a justiça e o amor de Deus, onde as pessoas enfatizam de tal maneira o atributo do amor, que entendem que o atributo da justiça está sujeito ao próprio amor, como se Deus fosse mais amor do que justiça. Essa compreensão equivocada geralmente resulta na heresia do universalismo, ou, no mínimo, numa noção muito equivocada da doutrina da salvação, onde o Deus soberano parece não ter qualquer autonomia.
    Sobre isso, a verdadeira doutrina bíblica é a de que Deus é todo amor e todo justiça. O fato de Deus providenciar o plano de redenção não o faz ser mais amor do que justiça, e o fato de Ele punir eternamente o pecador que não foi justificado pela obra de Cristo, não o faz injusto ou menos amoroso. Os atributos de Deus se complementam ao invés de se excluírem mutuamente.
    O homem continua sendo homem mesmo que não tenha alguns de seus atributos humanos. Deus, diferente disso, não poderia ser Deus se lhe faltasse um de seus atributos, pois Ele é perfeitamente expresso em cada um deles.

Quais são os atributos de Deus?


    Antes de falarmos quais são os atributos de Deus, precisamos entender que a teologia, para facilitar a compreensão desse assunto, divide os atributos de Deus em duas categorias: atributos incomunicáveis e atributos comunicáveis.
    Os atributos incomunicáveis, também chamados de atributos não-relacionados, são aqueles que Deus não compartilha com nenhuma criatura, ou seja, são atributos exclusivos dele e Ele não os comunicou a mais ninguém.
    Os atributos comunicáveis são aqueles que Deus compartilha, pelo menos em certa medida, com o homem. Os atributos comunicáveis foram impressos na criação da humanidade, e basicamente por isso o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus, isto é, porque Deus comunicou a ele alguns de seus atributos, e por portar tais atributos, o homem se parece com Deus em alguns aspectos.
    A seguir, conheceremos quais são os atributos de Deus, e entenderemos, mesmo de forma bastante resumida e limitada, uma noção básica de cada um deles.

Os atributos incomunicáveis de Deus

1- Asseidade: significa que Deus é auto-existente, e não necessita de nada nem ninguém para continuar a existir, ou seja, Ele não depende de ninguém fora de si mesmo para ser o que é. Obviamente a asseidade de Deus está diretamente ligada a sua eternidade (Sl 90:1,2).

2- Eternidade: significa que Deus sempre existiu, Ele não foi criado por ninguém e está acima de qualquer limitação de tempo (Gn 21:33; Sl 90:1,2). Ele não tem começo nem fim, e existe sem sucessão de momentos, ou seja, para Ele não existe passado, presente e futuro, pois seu presente é sempre a própria eternidade.

3- Unidade: significa que Deus é um e que todos os atributos dele estão inclusos em seu ser o tempo todo. A doutrina da Trindade não contradiz esse principio, pois as três Pessoas distintas formam um único Deus, ou seja, sua essência é indivisível (Dt 6:4; Ef 4:6; 1Co 8:6; 1Tm 2:5).

4- Imutabilidade: significa que Deus não muda jamais, ou seja, tanto Seu ser como Suas perfeições não sofrem qualquer alteração, e Ele não muda, de forma alguma, os Seus propósitos e promessas (Tg 1:17). Aqui é importante entender que qualquer tipo de alteração que as Escrituras pareçam sugerir é apenas figuras de linguagem para que nós, humanos, possamos compreender de forma mais didática o relacionamento dele conosco.

5- Infinitude: significa que Deus é infinito em seu ser e não sofre qualquer tipo de limitação. O tempo e o espaço não podem limitá-lo (1Rs 8:27; At 17:24-28). Talvez a qualidade da infinitude seja um dos atributos de Deus que apresenta mais dificuldade de compreensão por parte dos homens. Geralmente os estudiosos entendem que a infinitude de Deus também aparece revelada através de outros atributos, como a onipresença, onisciência, onipotência e a eternidade.

6- Onipresença: significa que Deus não é limitado de nenhuma forma pelo espaço. Sua presença é infinita, de modo que Ele está presente em toda parte com toda plenitude do Seu ser (Sl 139). Saiba mais o que é a onipresença de Deus.

7- Onipotência: significa que Deus possui todo poder, isto é, seu poder é infinito e ilimitado. Deus é soberano e capaz de cumprir todos os Seus propósitos (2Co 6:18; Ap 1:8). Saiba mais o que é a onipotência de Deus.

8- Onisciência: significa que Deus conhece todas as coisas de modo completo e absoluto. Seu conhecimento é infinito e não está sujeito a qualquer limitação. Ele não precisa pedir nenhuma informação, bem como nunca possui dúvidas (Sl 139; 147:4). Saiba mais sobre a onisciência de Deus.

9- Soberania: significa que Deus controla todas as coisas, pois Ele próprio é soberano e supremo sobre tudo e todos. Ele é quem governa o universo e conduz a História segundo os seus propósitos eternos. Também é importante saber que a soberania de Deus não anula a responsabilidade humana, e nem a responsabilidade humana descaracteriza as ações soberanas de Deus (Fp 2:12,13).

DIGNO DE LOUVOR

    Os atributos incomunicáveis de Deus nos mostram a maneira como Deus é diferente de nós e a maneira em que ele nos transcende. Seus atributos incomunicáveis revelam por que lhe devemos glória, honra e louvor.
    Geralmente, nos levantamos e damos elogios a pessoas que nos excedem por um momento e, depois, não as ouvimos mais.
    Contudo, aquele que tem o próprio poder de ser em e de si mesmo eternamente, de quem cada de um nós é totalmente dependente e a quem devemos gratidão eterna por todo fôlego de ar que respiramos não recebe a honra e a glória de suas criaturas, a honra e a glória que ele merece tão ricamente. Aquele que é supremo merece a obediência e a adoração daqueles que criou.

Os atributos comunicáveis de Deus

10- Amor: a Bíblia declara explicitamente que “Deus é amor” (1Jo 4:8). O amor, como um dos atributos de Deus, deve ser entendido, sobretudo, pelo aspecto do que os escritores do Novo Testamento chamaram de “amor ágape“, isto é, um amor profundo e incondicional, que ao mesmo tempo em que revela grande afeição, também revela cuidado, zelo, correção e abnegação.
    O apóstolo Paulo escreveu que o amor de Deus é derramado no coração dos cristãos genuínos (Rm 5:5). Certamente a maior manifestação do amor de Deus foi enviar Jesus, seu Filho, para morrer por pecadores. Esse ato imerecido é designado como graça (Ef 2:4-8). Aqui mais uma vez vale ressaltar que o atributo do amor não anula os atributos da santidade, justiça e retidão.
    A própria obra de Cristo no Calvário deixa isso muito bem claro, pois se por um lado vemos seu infinito amor ao enviar seu próprio Filho, por outro vemos que esse ato serviu para satisfazer a sua justiça e santidade. Se Ele fosse mais amor do que justiça, santidade e retidão, Ele poderia ter perdoado os pecadores sem precisar sacrificar seu próprio Filho.
    Logo, não existe qualquer base bíblica ou fundamentação lógica para dizer que os demais atributos de Deus estão sujeitos e subordinados ao seu atributo do amor, resultando, como já foi dito, na heresia do universalismo, ou, em alguns casos, no próprio aniquilacionismo.

11- Bondade: esse atributo está diretamente ligado ao atributo do amor, enfatizando a benevolência de Deus para com suas criaturas. A bondade de Deus também implica na realidade de que tudo o que Ele faz é essencialmente bom e legítimo, mesmo que o homem não compreenda (2Cr 30:18; Sl 86:5; 100:5; 119:68; At 14:17).

12- Misericórdia: a misericórdia é outro atributo que também está ligado ao atributo do amor, e revela a compaixão e piedade Deus para com os miseráveis e angustiados (Ef 2:4,5). Na verdade, além da misericórdia e bondade (citada acima), existem várias outras características de Deus que estão relacionadas ao atributo do amor, como por exemplo, a benevolência, a benignidade e a longanimidade. Através do capítulo 5 da Epístola aos Gálatas, percebemos que muitos dos atributos comunicáveis de Deus são compartilhados com os cristãos através do fruto gerado pelo Espírito Santo.

13- Sabedoria: significa que Deus é infinitamente sábio, de modo que Ele próprio é a fonte da sabedoria. O profeta Daniel entendeu isso ao dizer que “dele são a sabedoria e a força” (Dn 2:20; cf. Jó 12:13; Jó 36:5; Sl 147:5; Is 40:28; Rm 11:33). Além disso, devemos entender que a sabedoria de Deus é completamente superior à sabedoria dos homens (Is 55:8; cf. Jó 28:12-28; Jr 51:15-17).

14- Justiça: significa que Deus é plenamente justo e perfeito em sua retidão. Não há injustiça em Deus, e dele não provém nenhum tipo de desigualdade. Ele sempre é correto, e seus juízos são perfeitos (Sl 11:7; Dn 9:7; At 17:31). Muitos estudiosos também detalham o atributo da justiça em outras características específicas, como a retidão e a equidade.

15- Santidade: significa que Deus é completamente separado do pecado, e totalmente comprometido com sua honra. Ele nunca está relacionado a qualquer coisa impura ou qualquer comportamento indigno (Is 40:25; Hc 1:12; Jo 17:11; Ap 4:8). O atributo da santidade em Deus exige que os pecadores estejam separados dele, a menos que estes sejam justificados pelos méritos de Cristo, sendo feitos nele santo.

16- Veracidade: significa que Deus, e tudo o que provém dele, é necessariamente verdadeiro, infalível e absolutamente confiável (Hb 10:23), de modo que Ele é o próprio Deus verdadeiro (Jo 17:3). O atributo da veracidade também expressa a fidelidade de Deus, ou seja, tudo o que Ele revelou de si mesmo é genuíno, e por ser fiel, Ele nunca fará nada que afronte a sua própria natureza ou contradiga sua palavra.

17- Liberdade: significa que Deus não precisa de nada nem ninguém para fazer o que quer, ou seja, Ele é completamente livre para executar sua vontade (Mt 11:26; cf. Is 40:13,14) de acordo com a perfeição de sua natureza, ou seja, apesar de ser completamente independente e livre, isso não significa que Ele seja livre para pecar, mentir, deixar de ser Deus ou mesmo morrer, pois trais coisas contrariam seu próprio ser.

18- Paz: esse atributo de Deus nos revela que nele próprio, ou em qualquer uma de suas ações, não há nenhum tipo confusão ou desordem. Gideão entendeu essa qualidade de Deus quando declarou “O Senhor é paz” (Jz 6:24).

Conclusão sobre os atributos de Deus

    Essa lista de atributos de Deus não deve ser entendida como uma lista exaustiva, já que se trata de um estudo limitado pela nossa compreensão do ser de Deus, bem como não deve ser considerada uma lista padrão, pois há muitas listas sobre os atributos de Deus, algumas mais completas e detalhadas e outras mais diretas e objetivas.
    Infelizmente muita gente que se intitula cristão e não conhece os atributos de Deus acaba criando para si a visão de um tipo de deus que nada tem a ver com o verdadeiro Deus. Que possamos nos atentar para o conselho do nosso Senhor através do profeta Jeremias, e entender que o nosso maior motivo de orgulho deve ser o de conhecê-lo e compreender os seus atributos (Jr 9:23,24).
    Sem dúvida, mesmo diante de nossas limitações, estudar sobre quais são os atributos de Deus é algo maravilhoso que nos leva a admirar sua majestade, magnificência e grandiosidade.


Bibliografia

Grudem, W. (2017). Bases da fé cristã: 20 fundamentos que todo cristão precisa entender. Thomas Nelson Brasil.


Sproul, R. C. (2018). Somos todos Teólogos.


Conegero, D. (2017, April 4). Quais São os Atributos de Deus? Estilo Adoração -Estudos Bíblicos e Devocionais. 


Gilberto, A. (2015). Teologia sistemática pentecostal. CPAD - Casa Publicadora das Assembleias de Deus.


Sproul, R. C. (2022). Verdades essenciais da fé cristã - Cad. 1. Editora Cultura Cristã. 


Sproul, R. C. (2022). Verdades essenciais da fé cristã - Cad. 2. Editora Cultura Cristã. 


Sproul, R. C. (2022). Verdades essenciais da fé cristã - Cad. 3. Editora Cultura Cristã. 


Strong, A. H. (2020).  Teologia Sistemática (vol. 1-3): Edição Completa. e-artnow. 


Brasil, S. B. do. (2012). Manual bíblico SBB. American Bible Society.


Thompson, F. C. (1992a). Bíblia de referência Thompson:  sistema de estudo bíblico original e exaustivo de Thompson.

Close Menu